Um dos pontos questionáveis de uma das
reformas processuais por que passou o Brasil nos últimos anos foi a
introdução do § 5º no art. 219 do CPC, operada pela Lei n. 11.280/2006,
cujo dispositivo dá ao juiz o poder de reconhecer a prescrição de ofício
no processo civil: “§ 5oO juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.”
O texto não expressa se esse poder processual poderá ser exercido em qualquer grau de jurisdição. Surge então a dúvida: caberia o reconhecimento ex officio da prescrição no julgamento de recurso especial?
Não vamos aqui discutir se o STJ, uma vez
conhecido o recurso especial por algum fundamento (isto é, feito o
juízo positivo de admissibilidade), poderá decidi-lo por um fundamento
jurídico diverso, mesmo na falta de prequestionamento.
O enfoque é outro.
É difícil aceitar que o tribunal
reconheça de ofício a prescrição sem exercer o dever de consulta,
provocando as partes para debaterem, em contraditório, sobre a questão
nova a ser decidida. Isso não apenas para que se observe o princípio da
cooperação, ou o do contraditório (para os que não admitem existência do
princípio da cooperação no direito brasileiro em vigor), mas também
porque não se pode decidir se há ou não a prescrição sem se examinarem
as causas interruptivas e suspensivas do prazo prescricional!
O ato-fato jurídico da prescrição supõe a
inércia do titular de uma pretensão por um lapso de tempo e a ausência
de uma causa de suspensão ou interrupção do prazo prescricional.
Ocorrido o fato ensejador da interrupção (por exemplo, o protesto),
modifica-se a contagem do prazo.
Em última análise, não é dado ao juiz ou
tribunal reconhecer, de ofício, a prescrição, sem que as partes
litigantes tenham a oportunidade de debater e de demonstrar se ocorrera
ou não alguma das causas de suspensão ou interrupção do prazo
prescricional. Ora, sabe-se que o STJ para decidir o recurso especial
não pode revolver questões fáticas (súmula 07 do STJ).
O reconhecimento da prescrição, porém,
passa inevitavelmente por essa análise, pois a ocorrência de uma causa
suspensiva ou interruptiva do prazo prescricional é questão de fato,
que, diga-se de passagem, sequer teria sido examinada pelo tribunal de
origem. Os limites da cognição em recurso especial não comportariam essa
nova discussão fática e probatória.
Conclusão: apesar do art. 219, § 5º do
CPC, entendemos não ser possível o reconhecimento de ofício da
prescrição em sede de recurso especial.
Por último, um esclarecimento: nada temos
contra a possibilidade de o juiz reconhecer, de ofício, a prescrição. O
problema está na pobreza do enunciado legislativo, que foi silente
quanto à necessidade de prévio debate entre as partes litigantes. Nada,
porém, que uma leitura do dispositivo conjugada com o princípio da
cooperação (ou do contraditório) não possam resolver.
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