Por: Pedro Henrique Nogueira
Advogado e consultor jurídico. Pós-Doutor (UFPE), Doutor (UFBA) e Mestre em Direito (UFAL). Professor na UFAL (graduação e mestrado). Membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo (ANNEP), do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) e do Instituto Iberoamericano de Direito Processual.



8 de setembro de 2012

Sobre o reconhecimento, de ofício, da prescrição em sede de recurso especial

   Um dos pontos questionáveis de uma das reformas processuais por que passou o Brasil nos últimos anos foi a introdução do § 5º no art. 219 do CPC, operada pela Lei n. 11.280/2006, cujo dispositivo dá ao juiz o poder de reconhecer a prescrição de ofício no processo civil: “§ 5oO juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.”
   O texto não expressa se esse poder processual poderá ser exercido em qualquer grau de jurisdição. Surge então a dúvida: caberia o reconhecimento ex officio da prescrição no julgamento de recurso especial?
   Não vamos aqui discutir se o STJ, uma vez conhecido o recurso especial por algum fundamento (isto é, feito o juízo positivo de admissibilidade), poderá decidi-lo por um fundamento jurídico diverso, mesmo na falta de prequestionamento.
   O enfoque é outro.
   É difícil aceitar que o tribunal reconheça de ofício a prescrição sem exercer o dever de consulta, provocando as partes para debaterem, em contraditório, sobre a questão nova a ser decidida. Isso não apenas para que se observe o princípio da cooperação, ou o do contraditório (para os que não admitem existência do princípio da cooperação no direito brasileiro em vigor), mas também porque não se pode decidir se há ou não a prescrição sem se examinarem as causas interruptivas e suspensivas do prazo prescricional!
   O ato-fato jurídico da prescrição supõe a inércia do titular de uma pretensão por um lapso de tempo e a ausência de uma causa de suspensão ou interrupção do prazo prescricional. Ocorrido o fato ensejador da interrupção (por exemplo, o protesto), modifica-se a contagem do prazo.
   Em última  análise, não é dado ao juiz ou tribunal reconhecer, de ofício, a prescrição, sem que as partes litigantes tenham a oportunidade de debater e de demonstrar se ocorrera ou não alguma das causas de suspensão ou interrupção do prazo prescricional. Ora, sabe-se que o STJ para decidir o recurso especial não pode revolver questões fáticas (súmula 07 do STJ).
   O reconhecimento da prescrição, porém, passa inevitavelmente por essa análise, pois a ocorrência de uma causa suspensiva ou interruptiva do prazo prescricional é questão de fato, que, diga-se de passagem, sequer teria sido examinada pelo tribunal de origem. Os limites da cognição em recurso especial não comportariam essa nova discussão fática e probatória.
   Conclusão: apesar do art. 219, § 5º do CPC, entendemos não ser possível o reconhecimento de ofício da prescrição em sede de recurso especial.
         Por último, um esclarecimento: nada temos contra a possibilidade de o juiz reconhecer, de ofício, a prescrição. O problema está na pobreza do enunciado legislativo, que foi silente quanto à necessidade de prévio debate entre as partes litigantes. Nada, porém, que uma leitura do dispositivo conjugada com o princípio da cooperação (ou do contraditório) não possam resolver.

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